Logo após
o Concílio Vaticano II, as formas colegiadas ganharam vigor e muitas
experiências bonitas aconteceram. As conferências episcopais ganharam força; os
diversos conselhos em âmbito diocesano, paroquial e comunitário também. O povo
começou a se sentir verdadeiramente Igreja e a sair da passividade de séculos.
Nas primeiras Campanhas da Fraternidade no Brasil, os lemas e os objetivos
sempre lembravam a todos o sentido comunitário da Igreja. “Lembre-se: você
também é Igreja” (1964); “Faça da sua paróquia uma comunidade de fé, culto e
amor”; (1965); Em 1966, o objetivo da campanha assim dizia: “Reavivar nos fiéis
a consciência de que são membros do povo de Deus, corresponsáveis por toda a
comunidade da Igreja local, diocesana, nacional e universal, e chamados a
servir todos os homens, especialmente os pobres”.
Com esse
espírito, a Igreja no Brasil promoveu, na década de 1970, uma proliferação –
sem igual na sua história – de comunidades eclesiais de base. Abandonou a mania
de grandes construções e fomentou a multiplicação de centros comunitários por
toda a parte. Essa metodologia eclesial favoreceu o surgimento de inúmeras
lideranças leigas para a Igreja e para a construção de uma nova sociedade.
Grupos de
rua: experiência concreta de colegialidade
Entre as
experiências de participação colegiada, nasceram os círculos bíblicos, os
grupos de reflexão, os grupos de rua, de quarteirão e outros. Verdadeiras
sementes de novas CEBs. Essa estrutura circular começava a fazer frente à
rígida estrutura piramidal da Igreja. Fortaleciam-se os conselhos, onde o
exercício da colegialidade ganhava mais espaço de fraternidade e
corresponsabilidade na Igreja.
Na
América Latina e, sobretudo, no Brasil, as paróquias estavam se abrindo à
experiência das comunidades e dos diversos grupos de reflexão, fortalecendo uma
eclesiologia de comunhão e participação, como apregoou Puebla. Os teólogos que
aprofundavam essa eclesiologia foram duramente perseguidos, assim como os que
aderiam ao método da Teologia da Libertação e apoiavam a vivência das CEBs. É
interessante observar que os ataques a esse modo de governar a Igreja partia de
quem percebia que dessa forma surgiria nova maneira de ser Igreja: mais
fraterna, mais humana, descentralizada e menos burocrática.
É
exatamente aí que está a riqueza da colegialidade: quebrar o poder monárquico e
fazer valer a voz de todos os batizados, nas mais diversas esferas eclesiais.
Resgata-se assim, de forma genuína, o evangelho, onde Jesus deixa claro que a
única hierarquia que deve haver entre irmãos é a do serviço. Não é palavra
revelada o que lemos: “Quem quer ser o maior, o primeiro, seja o servidor de
todos, seja o último”? A própria Lumen Gentium reconhece que o múnus de
ligar e desligar dado a Pedro em Mateus 16 foi dado também ao colégio em Mateus
18 e 26,18-20.[LG n.22] Os diversos grupos e círculos, com maior
contato com a Palavra de Deus, iam adquirindo o espírito de fraternidade, a
consciência de que o poder na Igreja não podia ser exercido da mesma forma que
o fazem os poderosos na sociedade civil. Como lemos em Marcos, Jesus apresenta
uma avaliação dos governantes do império romano: “Os que são reconhecidos como
chefes utilizam o seu poder para tiranizar os povos, e os grandes não fazem
outra coisa senão oprimir os seus súditos”. Então Jesus, olhando para os seus discípulos, lhes disse: “Mas, entre vocês,
não deverá ser assim” (Mc 10,35-45).
Na
América Latina, a experiência vivida nos círculos bíblicos ou grupos de rua
revela que essas iniciativas da base foram geradoras de inúmeras comunidades.
Estas já nasciam no espírito da colegialidade, segundo o qual todos
participavam e se sentiam corresponsáveis pela comunidade. Portanto, se
quisermos uma Igreja nova, com paróquias renovadas, como rede de comunidades ou
comunidade de comunidades, precisamos multiplicar os pequenos grupos de
cristãos que, em torno da Palavra de Deus, se unem e se reúnem para iluminar
sua prática inspirados pela pergunta de fundo: “O que faria Jesus se estivesse
em nosso lugar?” Conhecendo cada vez mais a prática de Jesus, os cristãos vão
construindo a própria vida e orientando suas ações por tudo o que Jesus falou e
fez. Essa simples experiência vivida nos grupos de rua é semente de nova
liderança nas comunidades.
Grupos de
rua: espaço de formação de novas lideranças
Quanto
mais uma pessoa se identifica com seu grupo, quanto mais se sente motivada a
exercer sua liderança, melhor percebe a necessidade de mais formação, maior
conhecimento da vida de Jesus, dos evangelhos e de outros instrumentos para
analisar a realidade social que a cerca; melhor percebe que uma leitura
superficial e fundamentalista da Bíblia não corresponde às necessidades reais
suas e de seus irmãos e irmãs; melhor percebe que essa Palavra, para iluminar
sua vida e a de seu grupo, precisa ser confrontada com a realidade social,
política e cultural que a cerca. Por isso, a colegialidade vivida nos grupos de
rua serve também para fazer surgir inúmeras iniciativas no campo da formação,
para um bom exercício da liderança no próprio grupo, na comunidade maior e
também na sociedade, nas lutas em resgate da cidadania civil e cristã.
O
ministério da coordenação de grupos de rua é por demais exigente, sério e
comprometedor. Basta imaginar que daí pode estar surgindo uma nova comunidade,
a exemplo das primeiras comunidades que aparecem no Novo Testamento. Vejamos o
esquema do nascimento da comunidade de Filipos e o comparemos com o surgimento
de inúmeras comunidades eclesiais de base. Paulo e Timóteo, passando por
Filipos, não encontram sinagoga e, procurando por um lugar de oração, descobrem
um grupo de mulheres à beira do rio; a elas anunciam a boa-nova e uma delas os
hospeda em sua casa, recebe o batismo e daí nasce a primeira comunidade cristã
na Europa (cf. At 16,11-15).
Aquilo
que nasce tão espontaneamente precisa depois de aprofundamento no conhecimento
da proposta do ser cristão no mundo, no seguimento de Jesus. É preciso, então,
evitar toda e qualquer acomodação; ir atrás de formação para melhorar, cada vez
mais, a participação nos processos de agrupar mais pessoas em torno do projeto
de evangelização transformadora, em vista do anúncio e antecipação do Reino.
Foi,
portanto, nas casas daqueles que aceitaram o seguimento de Jesus que nossa
Igreja nasceu. E é exatamente esse o elo que une a experiência primitiva e a de
tantos grupos de rua: ser Igreja de casa em casa, Igreja que vai ao encontro
das pessoas lá onde elas vivem o seu dia a dia. A casa se configura como espaço
privilegiado de evangelização, lugar propício da experiência com Jesus, o qual
impele os que a fazem a passar a boa-nova para a frente (Mt 8,14; Lc 10,38;
19,5). Era nas casas que acontecia a celebração da ceia, onde se mantinha viva
a memória do Ressuscitado (Lc 22,11-12; Mt 26,18). E a experiência da didaskalia,
isto é, do ensinamento, da formação, também se dava nas casas (Mt 13,36; Mc
16,14; At 1,13-14; 2,1.42-47; 16,14-15.32-34; 18,7-8; 20,20). Os grupos de rua,
nos moldes de hoje, configuram-se como Igreja nas casas, Igreja de casa em
casa, semente de novas comunidades e fonte geradora de novas lideranças.
Pe. Manoel Godoy: Mestre em
Práxis Cristã pela Faje (Belo Horizonte), é diretor-executivo do Ista –
Instituto São Tomás de Aquino (Belo Horizonte), pároco e professor de teologia.
Foi assessor da CNBB (por dez anos) e da Organização dos Seminários
Latino-Americanos, do Celam (Bogotá). E-mail: manologodoy@terra.com.br
(Publicado
na íntegra na revista Vida Pastoral em janeiro-fevereiro – 2014)
sinto saudades dos meus tempos em mg das nossas cebs mais dou graças a Deus continuo firme na igreja aqui na baixada fluminense e que o senhor aumente nossa fé e a nossa conciencia
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